16 maio 2012

Laços de (re)escrita

O gêmeo do escritor (The Writer's Twin) é um artigo bem interessante sobre tradução, escrito por Judith Thurmann e publicado no novo blog de literatura da revista New Yorker, o Page-Turner. O artigo na íntegra encontra-se neste link. Thurmann aproveita a publicação de uma nova tradução de Madame Bovary, tanto para tecer elogios à tradutora, Lydia Davis, quanto para refletir sobre o ato de traduzir. Ela enfatiza a diferença entre os códigos linguísticos (inglês e francês) para levantar a questão da diferença (no sentido de "outro") entre o original e a tradução. Por mais brilhante que seja em sua empreitada, Davis não consegue sugerir, por exemplo, à exemplo de Flaubert, o universo feminino a partir de palavras que pertencem ao gênero em francês. Partindo de exemplos como esse, a autora alude a imagem do (grande) tradutor como irmão gêmeo do (grande) escritor. Esses gêmeos não são idênticos. E, muitas vezes, tampouco, dividem o mesmo sexo. Achei uma analogia criativa.

Nesse mesmo artigo ela comenta sobre sua experiência em traduzir a autora mexicana Sor Juana Inés de la Cruz e a francesa Louise Labé. Ambas são figuras emblemáticas para o feminismo. A última, morreu dois anos antes de Shakespeare nascer e era uma mulher muito avançada para qualquer época. Thurmann cita também uma tradução sua de Labé. Gostei tanto que resolvi traduzir a tradução. Ao me inserir nessa teia, sem pensar duas vezes, me coloco na qualidade de irmão adotivo de Louise. Segue a minha afiliação fraterna:

Eu ardo em fogo, afundo, vivo, definho,
Sinto calor e frio em seus extremos;
A vida tanto parece frágil quanto amorfa;
Minha alegria se mistura com a angústia.
Num mesmo instante eu choro e rio,
Teço mágoas enquanto sinto o gozo
O bom da vida é eterno e efêmero
Num mesmo instante eu broto e morro
Assim o Amor me conduz volúvel,
E ao pensar que a dor vai sangrar,
Fico em paz sem menos esperar
E quando, enfim, certo do gozo
Estou no limiar da felicidade,
Ele me traz de volta o alvoroço.

Eis o texto de Thurmann

I burn in fire, I drown, I live, I languish,
I feel the heat and cold at both extremes;
Life both brittle and too shapeless seems;
My joy is intermingled with my anguish.
All in an instant do I laugh and cry,
I suffer my grievance as I take my pleasure;
My good life leaves me, and it lasts forever;
All in an instant do I bloom and dry.
Thus Love leads me on inconstantly,
And when I think my sorrow must increase,
I find myself unwittingly at peace.
And when, at last, believing joy at hand,
I stand upon the threshold of my bliss,
He casts me down to where my grief began.

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