15 abril 2009

Contos Favoritos

A Corrida dos Gordos


Eu estava apaixonada por um homem chamado Cuthbert, disse avó Inacia, e, Oh, ele realmente comia. Ele costumava sentar a mesa com um pernil de veado, um frango inteiro, dois ou três pães ou uma travessa de espaguete, meia dúzia de espigas de milho ou uma porção de cenouras cruas. Ele comia tudo, em seguida saía pra trabalhar no campo. Ele era bem grande, mas sólido feito pedra – músculos, não gordura. Ele me agarrava e colocava no colo dele, falando comigo em Michif*. Ele me chamava de sua peti’ shoo. Eu ia casar com Cuthbert e a data do casamento já estava arranjada, quando as irmãs dele tentaram colocá-lo contra mim. Elas disseram que eu estava atrás do dinheiro dele, que eu queria as terras dele, e que eu também estava mantendo relações sexuais com o Diabo.
Apenas a última acusação era verdade.

Nosso padre tinha avisado que cada um de nós possui dois anjos: um é o nosso guardião, e o outro é o anjo da perversão. Que o segundo anjo tentaria nos convencer de que é o primeiro, ele disse, e suponho que caí nessa. Á noite, nos meus sonhos, eu recebia a visita de um homem vestido de azul – terno azul, camisa azul, gravata azul, sapatos azuis, mas sem chapéu. Ele tinha cabelos pretos e olhos escuros, pele da cor de um ovo marrom pálido, muito macia e lisa. Ele despia toda a indumentária azul e a colocava aos meus pés. Seu instrumento de prazer – não ria de mim – era azul também, como se tivesse sido mergulhado numa bonita tinta azul, meia-noite na ponta. Eu o admirava, então deitava com ele a noite inteira. Você sabe do que estou falando. De manhã eu despertava enojada pelo que eu havia feito. Ele dizia as coisas mais doces pra mim, como um anjo bom, mas as coisas que ele fazia eram obscuramente inspiradas.

...
* Michif. é um dialeto do norte dos EUA e Canadá falado por nativos e originado a partir do francês e línguas indígenas.

Original: The Fat Man’s Race, de Louise Erdrich
Tradução: Tarco

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