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02 setembro 2014

EMILY'S CARRIAGE


Baseado no poema "Porque eu não conseguia parar para a Morte", de Emily Dickinson, esta pintura pretende trazer Dickinson e sua poesia para o mundo de hoje da cultura pop, colocando-a, não em uma carruagem puxada por cavalos, mas em um táxi retrô. Na cabine, também estão William Shakespeare e Jack Kerouac, representando diferentes períodos da poesia, tanto clássicos, quanto no ápice da vanguarda. Dentro do automóvel é preto e branco, enquanto o exterior é colorido, um contraste entre o presente (exterior) e o passado (interior), embora os personagens ainda existam, em certa medida (mesmo tendo mudado o próprio tom). O carro sai da perspectiva enquanto o sol se põe, em representação às mortes físicas dos poetas, um pouco mais lentas e incompletas em seus vários gêneros do que a morte aparente da própria poesia na cultura popular atual.


April A. Fontaine é um artista autodidata que vive no interior da Nova Inglaterra, EUA. Sua obra de arte foi premiada pelos membros da exposição Dead Poets.


Emily Dickinson (1830 - 1886)
(712)

Because I could not stop for Death – 
He kindly stopped for me – 
The Carriage held but just Ourselves – 
And Immortality.

We slowly drove – He knew no haste
And I had put away
My labor and my leisure too,
For His Civility – 

We passed the School, where Children strove
At Recess – in the Ring – 
We passed the Fields of Gazing Grain – 
We passed the Setting Sun – 

Or rather – He passed us – 
The Dews drew quivering and chill – 
For only Gossamer, my Gown – 
My Tippet – only Tulle – 

We paused before a House that seemed
A Swelling of the Ground – 
The Roof was scarcely visible – 
The Cornice – in the Ground – 

Since then – ‘tis Centuries – and yet
Feels shorter than the Day
I first surmised the Horses’ Heads 
Were toward Eternity –

29 abril 2014

Carl Sandburg


Consultei professores que trabalham com o sentido da vida em busca
de saber o que é felicidade.
E também procurei grandes executivos que comandam
homens aos milhares.
Eles balançaram a cabeça e sorriram como
se eu estivesse de brincadeira
E então num domingo a tarde vaguei ao longo
do rio Desplaines
E vi um grupo de húngaros ao abrigo das árvores com
suas mulheres e filhos e um barril de cerveja e um
acordeão.  

Carl Sandburg
Tradução: Tarco

17 abril 2013

Joyce

Que achado! Um site dedicado a James Joyce, The James Joyce Center (aqui), disponibiliza Ulisses transmutado em quadrinhos.



Há também um projeto bem interessante que interpreta músicas inspiradas nos contos de Dublinenses: https://soundcloud.com/fathersofwesternthought12/sets/dubliners

Achei um prato cheio para quem gosta de música, literatura inglesa, cultura irlandesa e está estudando tradução.

04 abril 2013

Emily Dickinson em tradução

Avaliar tradução é um desafio. Para quem lida com a escrita, julgar a escrita alheia é tarefa geralmente desagradável em vista da particularidade do processo (só quem põe a mão na massa sabe). Pois julgar uma tradução é algo bem parecido: o trabalho que dá quando experimentamos traduzir, o constante fino que tiramos com o fracasso, e o exercício de humildade quando decidimos exibir o que conseguimos redimensionam por completo a tarefa de avaliar. Mas traduzir é preciso e toda tradução (de um mesmo texto), de certa forma, está avaliando uma tradução anterior. Trabalho no momento lecionando literatura traduzida e duas traduções de um poema de Emily Dickinson resultaram em ótimas discussões. Em sala, a tradução de Isa Mara foi unanimemente escolhida a melhor. O que acham?

Eis as traduções:


Os que estão morrendo, amor,
Precisam de tão pouco:
um Copo d’água, o Rosto
Discreto de uma Flor.

Uma lágrima, talvez um Leque,
E a certeza que nenhuma cor
do Arco-Íris perceba
Quando você for.

Tradução: Ana Cristina César

Quem morre, Querido, de pouco precisa
Apenas um Copo d’Água
O Rosto discreto da Flor
Pontuando a Parede lisa,

Um Leque, talvez, do Amigo a Mágoa
E a certeza de que alguém
No Arco-Íris não verá mais cor
Depois que você se for.

Tradução: Isa Mara Lando

O poema original:

The Dying need but little, Dear,
A Glass of Water’s all,
A Flower’s unobstrusive Face
To punctuate the Wall,

A Fan, perhaps, a Friend’s Regret
And Certainty that one
No color in the Rainbow
Perceive, when you are gone.




02 novembro 2010

Shirley Jackson


Apesar de pouco conhecida no Brasil, Shirley Jackson é considerada uma das maiores contistas americanas e admirada por autores famosos como Stephen King, Neil Gaiman, A. M. Homes, Joyce Carol Oates, dentre outros. Ela tornou-se célebre como autora de contos e romances de horror. Porém, ainda em vida, ela recusava o rótulo dos gêneros, acreditando que sua obra um dia falaria por si. São muitas interpretações que a obra de Jackson fez surgir no decorrer do tempo. Talvez o seu conto mais famoso seja The Lottery (A Loteria) de 1948, que dá título à coletânea de contos The Lottery and Other Stories, e que originalmente tinha como subtítulo The Adventures of James Harris (As Aventuras de James Harris). James Harris trata-se de um "elemento" desestabilizante que aparece na maioria das histórias, na forma de personagem ou de alucinação, sem que para isso seja necessário nomeá-lo James ou Harris. A autora retirou este tema de uma balada da tradição oral inglesa (James Harris, The Daemon Lover), formando assim um emaranhado de discursos e símbolos que fazem destas narrativas um verdadeiro diálogo com o imaginário coletivo americano. É muito interessante. Escolhi traduzir - livremente - Colloquy (Colóquio), basicamente pela brevidade do texto. Onde estará James Harris no Colóquio?

  Colóquio

Shirley Jackson


O doutor parecia competente e respeitável. A Sra. Arnold sentia-se vagamente confortável diante da aparência dele, o que amenizou um pouco a sua agitação. Ela sabia que ele havia notado a sua mão tremendo ao aproximar-se para que ele lhe acendesse o cigarro. Ela sorriu como a se desculpar, mas ele a encarou seriamente.
“A senhora parece aborrecida,” ele disse com preocupação.
“Estou muito aborrecida,” disse a Sra. Arnold. Ela tentava falar devagar e lucidamente. “Este é o motivo que me trouxe aqui ao invés de ir ao Dr. Murphy – nosso médico habitual.”
O médico franziu o cenho levemente. “Meu marido,” continuou a mulher. “Não quero que ele saiba que estou agitada, e o Dr. Murphy provavelmente acharia necessário informá-lo.” O médico assentiu, sem comprometer-se, a Sra. Arnold percebeu.
“O que a preocupa?”
A mulher respirou profundamente. “Doutor,” ela disse, “como as pessoas sabem se estão ficando loucas?”
O médico olhou para ela.
“Não é ridículo?,” ela disse. “Não queria ter colocado dessa forma. De qualquer modo, é algo difícil de explicar sem parecer tão dramático.
“Insanidade é mais complicado do que a senhora imagina,” disse o médico.
“Eu sei que é complicado,” ela respondeu. “Essa é a única coisa da qual eu tenho certeza. Uma das coisas que quero dizer é insanidade.”
“Por gentileza, o que disse?”
“Esse é o meu problema, doutor.” A Sra. Arnold escorou-se e retirou suas luvas de baixo da bolsa, colocando-as cuidadosamente por cima. Em seguida ela pôs as luvas em baixo da bolsa novamente.
“Por que não me contar a história por completo?,” ele disse.
A Sra. Arnold suspirou. “Todo mundo parece compreender,” ela começou, “e eu não. Olha.” Ela inclinou o corpo para frente, gesticulando com a mão enquanto falava. “Não entendo a maneira como as pessoas vivem. Antes, costumava ser tão simples. Quando criança eu vivia num mundo em que um monte de outras pessoas também vivia e todos conviviam juntos e as coisas caminhavam sem alvoroço.” Ela olhou para o médico. Ele estava assentindo de novo, e a Sra. Arnold continuou, a voz elevando-se aos poucos. “Olha. Ontem pela manhã meu marido parou para comprar o jornal no caminho para o trabalho. Ele sempre compra o Times, sempre do mesmo jornaleiro, e ontem o homem não tinha um Times pro meu marido e ontem a noite quando ele chegou em casa para o jantar ele disse que o peixe havia passado do ponto e queimado e que a sobremesa estava doce demais e ficou a noite toda sentado falando sozinho.”
“Ele podia ter procurado outro jornaleiro,” disse o médico. “É comum encontrar edições nas bancas do centro da cidade até tarde.”
“Não,” a mulher respondeu, lenta e distintamente, “Acho melhor recomeçar. Quando eu era criança –” ela disse. E logo interrompeu-se. “Olha,” disse, “existiam palavras como medicina psicossomática? Ou cartéis internacionais? Ou centralização burocrática?”
“Bem,” o médico arriscou.
“O que querem dizer?” Insistiu a Sra. Arnold.
“Num período de crise internacional,” o médico disse gentilmente, “quando você encontra, por exemplo, padrões culturais desintegrando-se rapidamente...”
“Crise internacional,” disse a Sra. Arnold. “Padrões.” Ela começou a chorar baixinho. “Ele disse que o homem não tinha o direito de não guardar um Times pra ele,” ela disse histericamente, procurando um lenço na bolsa, “ele começou a falar de planejamento social a nível local e rendimentos de sobretaxa e conceitos geopolíticos e inflação deflacionária.” A voz da Sra. Arnold ergueu-se num gemido plangente. “Ele realmente disse inflação deflacionária.”
“Sra. Arnold,” disse o médico, contornando a mesa, “não ajuda em nada colocar as coisas desse modo.”
“Não ajuda o quê?” ela disse. “Está todo mundo realmente ficando louco, exceto eu?”
“Sra. Arnold,” o médico falou com severidade, “Quero que a senhora se contenha. Num mundo desnorteado como o nosso atualmente, a alienação da realidade freqüentemente–”
“Desnorteado,” disse a Sra. Arnold. Ela levantou-se. “Alienação,” ela disse. “Realidade.” Antes que o médico pudesse detê-la, ela caminhou até a porta e a abriu. “Realidade,” ela disse, e foi embora.              

Tradução: Tarco Lemos


The Lottery and other stories
Shirley Jackson
Farrar, Straus and Giroux, 2005

23 abril 2009

Lawrence Raab

Quando li o poema abaixo não resisti e traduzi. Lindo, lembra Canção Por Acaso, da Adriana Calcanhotto (uma música sem som): expresão do indizível.
Lawrence Raab, o autor, eu não conhecia. Quanta gente, quanta alegria... As rimas da tradução são acidente.


O poema que não pode ser escrito


é diferente do poema
que não está escrito, ou os muitos

que nunca foram acabados – aqueles barcos
perdidos na neblina, à deriva

em latitudes calmas,
os mapas inúteis, as águas passadas

no poema que não pode
ser escrito não há perigo

com o desencargo de sentido
nenhum sentido. E este

é seu esplendor, assim é como
ele se torna um emblema

não de fracasso ou perda,
mas do impossível.

Então o vento surge. As velas gastas
inflam, e o ar fica brando.

Uma ilha verde aparece.
Todos estão salvos.


Tarco

15 abril 2009

Contos Favoritos

A Corrida dos Gordos


Eu estava apaixonada por um homem chamado Cuthbert, disse avó Inacia, e, Oh, ele realmente comia. Ele costumava sentar a mesa com um pernil de veado, um frango inteiro, dois ou três pães ou uma travessa de espaguete, meia dúzia de espigas de milho ou uma porção de cenouras cruas. Ele comia tudo, em seguida saía pra trabalhar no campo. Ele era bem grande, mas sólido feito pedra – músculos, não gordura. Ele me agarrava e colocava no colo dele, falando comigo em Michif*. Ele me chamava de sua peti’ shoo. Eu ia casar com Cuthbert e a data do casamento já estava arranjada, quando as irmãs dele tentaram colocá-lo contra mim. Elas disseram que eu estava atrás do dinheiro dele, que eu queria as terras dele, e que eu também estava mantendo relações sexuais com o Diabo.
Apenas a última acusação era verdade.

Nosso padre tinha avisado que cada um de nós possui dois anjos: um é o nosso guardião, e o outro é o anjo da perversão. Que o segundo anjo tentaria nos convencer de que é o primeiro, ele disse, e suponho que caí nessa. Á noite, nos meus sonhos, eu recebia a visita de um homem vestido de azul – terno azul, camisa azul, gravata azul, sapatos azuis, mas sem chapéu. Ele tinha cabelos pretos e olhos escuros, pele da cor de um ovo marrom pálido, muito macia e lisa. Ele despia toda a indumentária azul e a colocava aos meus pés. Seu instrumento de prazer – não ria de mim – era azul também, como se tivesse sido mergulhado numa bonita tinta azul, meia-noite na ponta. Eu o admirava, então deitava com ele a noite inteira. Você sabe do que estou falando. De manhã eu despertava enojada pelo que eu havia feito. Ele dizia as coisas mais doces pra mim, como um anjo bom, mas as coisas que ele fazia eram obscuramente inspiradas.

...
* Michif. é um dialeto do norte dos EUA e Canadá falado por nativos e originado a partir do francês e línguas indígenas.

Original: The Fat Man’s Race, de Louise Erdrich
Tradução: Tarco

11 janeiro 2009

Nada Aconteceu



Aqui vai uma bem bizarra pra vocês. Faz alguns anos, eu tinha 19, me preparava pra sair de casa, ir morar sozinho, e um dia enquanto eu aprontava minhas coisas, subitamente me veio a lembrança do meu pai sacudindo o pau dele no meu rosto quando eu era muito criança. Uma lembrança assim, que vem do nada, mas é tão detalhada e sólida que sei ser totalmente verdadeira. De repente eu sei que realmente aconteceu, não foi sonho, apesar de conter a mesma estranheza dos sonhos. Eis aqui a memória súbita. Eu tinha em torno de oito ou nove anos, estava sozinho na sala de vídeo, no andar de baixo. Eu assistia TV depois da escola. Meu pai entrou na sala e parou em pé diante de mim, entre eu e a televisão. Ele não disse nada, e nem eu. E sem nada dizer ele pôs o pau pra fora e começou a balançar aquilo na minha cara. Lembro que não havia mais ninguém em casa. Acho que era inverno, pois lembro do frio que fazia na sala de vídeo. Tanto é que eu estava enrolado com o cobertor da TV. Parte do grande espanto de ver meu pai balançando o pau na minha frente deve-se ao fato de ele não ter dito uma palavra sequer, (eu lembraria caso ele houvesse dito algo), e não ficou nada na memória sobre a expressão que ele tinha no rosto. Nem mesmo lembro se ele olhava para mim. Tudo que lembro é do pau. É como se o pau reclamasse toda a atenção. Ele estava sacudindo aquilo sem dizer nada, sem comentar nada, mexendo como a gente faz quando se masturba, mas, também, havia algo ameaçador, algo do tipo valentão, na forma como ele fazia aquilo. Lembro, também, de como o pau parecia um punho que ele colocava no meu rosto me desafiando a dizer alguma coisa, lembro de estar enrolado no cobertor da TV, e não poder levantar e sair da frente daquele pau, tudo que lembro é de ter girado a cabeça para todos os lados, tentando tirar aquilo da minha cara, (o pau). Este foi um desses incidentes completamente insanos que de tão estranhos não parecem estar acontecendo com você enquanto acontecem. A única vez que eu tinha visto anteriormente de relance o pau do meu pai foi num vestiário. Lembro de ter virado o rosto lentamente, o pau me seguindo insistentemente, e pensamentos altamente bizarros passando pela minha cabeça, como, “movo minha cabeça exatamente como uma cobra,” etc. Ele não teve ereção. Lembro que o pau era um pouco mais escuro do que o resto do corpo dele, e grande, com uma veia enorme e horrenda de um lado. O pequeno orifício na ponta parecia estreito e amuado, e abria e fechava de leve enquanto meu pai sacudia o membro, mantendo-o no meu rosto não importando para onde eu movesse a cabeça. Essa é a lembrança. Depois dela (a lembrança), eu passei a circular pela casa dos meus pais vagando, como uma nuvem, totalmente fora de mim, sem falar nem perguntar a ninguém sobre isso.

trecho de Nothing Happened, de David Foster Wallace

***
David Foster tem sido, pós-vida, considerado o maior autor americano de sua geração (1962-2008).

tradução: Tarco Lemos
gravura de Jean Cocteau

24 novembro 2008

últimas palavras

Arquimedes (212 A.C.): (ao receber ordens de um romano para que o seguisse) "Espere até eu finalizar esta equação."
Voltaire (1778): (ao dar de cara com a luz bruxuleante de uma lamparina) "O que? As chamas, já?"
Beethoven (1827): "Devo ouvir no Paraíso."
Gide (1951): "Temo que minhas frases estão se tornando gramaticalmente incorretas."

The Oxford Book of Death

Fontes outras

Goethe: "Mais luz! Mais Luz!"
J. M. Barrie: "Não consigo dormir."
Olavo Bilac: "Dêem-me café, vou escrever!"
Tchekov: "Não bebo champanhe há tempos."
Frida Kahlo: "Espero que seja uma saída alegre, e espero nunca retornar."
Mahler: "Mozart!"
Trotsky: "Não mate este homem. Ele tem uma história pra contar."

Tráfego: Tarco Zan

06 outubro 2008

uma história para crianças

Se eu avistasse na margem oposta a mim mesmo,
se eu gritasse pra mim vem aqui
e me observasse construir laboriosamente um bote
feito de restos, e me visse remando sobre as águas,
mas, ao cruzar a metade do caminho entre as margens,
bem no meio do lago translúcido,
não conseguindo mais aproximar-me, chegar perto,
desaparecesse, onde estaria eu agora, terá o bote virado?

Dan Chiasson
médium: Tarco Zan