09 abril 2013

Memento Mori



Houve um momento que resolvi desopilar em relação a pressão social acerca da data de aniversário. É um dia como outro qualquer, com a diferença que obrigatoriamente te faz parar um instante pra pensar na passagem do tempo. Neste ano, essa parada demorou horas entre a noite e a madrugada a dentro. Resolvi começar a leitura de um livrinho que eu queria ler faz tempo, Memento Mori (1959), de dame Muriel Spark. Eu não sabia, no entanto, que leria o volume de um só fôlego.

O romance é um dos melhores que li nos últimos anos. Quase todos os personagens do livro estão entre os 70 e 90 anos. De alguma forma, estão ligados por parentesco, amizade ou love affairs do passado. Suas preocupações giram em torno da questão dos bens - qual herdeiro será beneficiado em detrimento de outros no testamento -, da integridade física, difícil de ser mantida em suas casas, a vaidade (quem disfarça melhor os sinais do tempo) e a convivência em abrigos nos quais são subestimados, tratados de maneira infantilizada. Tinha tudo pra ser um romance triste - aquela maõzinha pra te empurrar no precipício da melancolia que bate no dia que você fica oficialmente mais velho - só que não, pelo contrário, o texto de Spark é gostoso, engraçado, rápido, como se realmente não houvesse tempo pra lamento fúnebre.

Os personagens recebem telefonemas misteriosos informando que irão morrer - daí o título do livro. Cada personagem recebe a mensagem de forma diferente, bem como criam imagens da pessoa que está do outro lado da linha totalmente divergentes. A maneira como recebem a notícia desnuda suas personalidades.

O romance ainda abre espaço para uma discussão bem em voga na época sobre a literatura inglesa do pós-guerra, que, sendo também produzida após as transformações da vanguarda modernista, voltou com força a um tipo de realismo contundente.

Li o romance na tradução de  Beth Vieira, tradutora que me apresentou Laços de Sangue, de Michael Cunningham, outro romance estimado.

Tarco

2 comentários:

Unknown disse...

Anotado!

Tua maturidade é divinal (lê-se: própria dos bons vinhos e das divindades gregas).

As pessoas vivem como se fossem eternas, talvez porque sejam mesmo. Se a vida nos houvesse moldado a certeza, certamente estaríamos mais mortos.

Tarco disse...

Tu me ama!

me assusta essa responsabilidade de tirar o melhor do tempo que nos cabe... peso na consciência, recomposturas, foco, vingança (matando o tempo).