10 maio 2006

A missiva

Caro não mais, Sr.:

Não vou me vangloriar daquela vingança, por abandonar-te aos ratos em Londres, até porque não pude me satisfazer por completo em meu regozijo. Apática. Após ter te derrotado no duelo de palavras sórdidas, não quis dar o último tiro de misericórdia quando tu já tanto me imploravas por isso. Ignorei cada célula tua pelo celular, mas apelaste em tua idéia fixa, derramando aquele esguicho de grunhido insuportavelmente quente do telefone no chão frio da madrugada, onde pus os pés. Acordaste a todos os desprecavidos com o choque térmico da tua insistência, quando eu me preparava para o sono, lavando meu rosto desfigurado pela escuridão das quase quatro horas matinais.

Audíveis três alôs de uma velha atemorizada pelo coito interrompido do silêncio. Não era eu. Morte súbita do outro lado da linha. A fronteira do ódio fora inaugurada. Se ultrapassada, nada sabemos ainda, mas a tua desistência afligiu um pouco minha obsessão de não atender às tuas ligações voláteis, de não atender a todas as minhas espectativas.

É estranho e bonito um amor com desejos bélicos isaciáveis de uma parte SANA e com lampejos pacíficos de outra parte IN. Não se pode mensurar as veias latejantes do corpo, nem a sua localização. A alma disse para eu prosseguir na distância aproximada, sem idas ao cinema ou a outros locais onde eu possa rememorar traumas de crimes recentes. Devo fazer solitária per verso a Jornada da Alma sobre um Dragão perverso que atém fogo e tempestades a um verde gramado cheio de olhos míopes fitando estrelas andantes.

Queria calar tua boca incestuosa com meu inglês desvairado, pronunciando o pecado: - SIN! SIN! SIN! Porque me reduzi a pó naquele dia e me reduzo agora à lama por tuas lágrimas. O complexo de castração dos castratti do meu coro é pungente. Eles penetram teu orifício auricular pudendo só com o som de uma voz soprano.

Soprando o vento, bati as portas na tua cara em meus sonhos irrealizáveis. Um corcunda de Notre Dame, um Cyrano de Bergerac, um Fantasma da Ópera. Sonhei ser uma aberração apaixonada, por incalculáveis desilusões e pelo orgasmo cético do sexo dos anjos. Por isso, morro aqui mesmo em tuas mãos com esta carta em vida, príncipe desencantado. Antes fosse aos teus pés, entretanto meu orgulho egóico me permite apenas estas letras incôngrues despejadas na palidez despautada de um papel ofício. Letras marginais jogadas na sarjeta de tua alma...
Ser Poeta: Um papel ou um ofício?

Adeus meu prepúcio, meu precipício! Adeus, meu exegeta!

Jovem Senhora


Pal

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